Chloë Lum e Yannick Desranleau

Chloë Lum e Yannick Desranleau
01.11.2018 - 30.11.2018

Vivem e trabalham em Montreal, Canadá. O trabalho da dupla é multidisciplinar e está centrado na teatralidade, na coreografia e na performance, assim como no interesse em encenar uma situação e trabalhar com materiais efêmeros que são operados por meio da reutilização e dissolução. Os trabalhos recentes da dupla investigam a representação dos objetos, a condição material do corpo e o potencial transformador que corpos e objetos exercem uns sobre os outros. Esses interesses são desvelados por meio da experiência de Chloë com uma doença crônica e o efeito disso na sua parceria como Yannick, juntamente com a exploração de narrativas de literatura, teatro e televisão. Para eles, é importante mostrar o corpo em ação, a fim de ilustrar os desconfortos e descobertas táteis durante um primeiro contato entre dois corpos; é por isso que a performance e o vídeo se tornaram dois dos meios favoritos de suas práticas, em transição com seus trabalhos instalativos.

O centro de arte contemporânea Diagonale e o Conseil des Arts de Montréal, em parceria com a Despina,  contemplaram Chloë Lum e Yannick Desranleau com uma bolsa integral para participar do nosso programa de residências em novembro de 2018. A pesquisa dos dois artistas no Rio de Janeiro partiu de uma imersão nos arquivos de cartas da escritora Clarice Lispector e da exploração de figurinos e acessórios que irão compor uma performance em vídeo a ser desenvolvida em breve. Dando continuidade ao tema das doenças crônicas, a dupla quer abordá-lo a partir de um viés transformador – um acontecimento sensorial e físico que eles pretendem ilustrar a partir do fenômeno da “segunda pele”. Assim, Chloë e Yannick estão interessados ​​em aprofundar a sua investigação sobre a elasticidade dos tecidos e a capacidade que eles têm de criar um efeito de transformação na forma do corpo por meio dessa propriedade – até talvez prolongá-lo.

A dupla já expôs no Center for Books and Paper Arts, Columbia College, Chicago (EUA); no Musée d’art contemporain de Montreal (Canadá); Kunsthalle Wien, Viena (Áustria); BALTIC Centre for Contemporary Art (Reino Unido); Whitechapel Project Space, Londres (Reino Unido);  University of Texas, Austin (EUA); The Confederation Centre Art Gallery, Charlottetown (Canadá); The Blackwood Gallery, University of Toronto (Canadá) e The Darling Foundry, Montreal (Canadá).  A dupla também é conhecida no cenário musical internacional como co-fundadores do grupo de avant-rock AIDS Wolf, inclusive produzindo pôsteres de concertos premiados sob o nome de Séripop. O trabalho da dupla está na coleção do Museu Victoria and Albert, Londres (Reino Unido), no Museu de Belas Artes de Montreal (Canadá) e no Musée d’arte contemporain de Montréal (Canadá).

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Os tropicais além-trópicos – duas cenas e um interlúdio em torno da obra de Chloë Lum e Yannick Desranleau (por Daniela Mattos)

Cena 1

Calor tropical, sol no volume máximo. Sobrado 271 da Rua do Senado, escada de madeira íngreme, chão de cimento queimado, paredes brancas – chego à Despina. Chloë Lum está em pé e Yannick Desranleau sentado atrás da mesa que configura o espaço de ateliê da dupla de artistas. Num movimento de rompante abraço Chloë, enquanto isso me dou conta de que talvez esse gesto seja demasiado informal para um primeiro studio visit. De cara os dois me parecem familiares, figuras que certamente circulariam nos mesmo espaços de artes visuais e música que frequento desde os anos 1990; estou certa de que seríamos amigos próximos caso morassem no Brasil (não à toa, eu e Chloë temos um passado comum como vocalistas de bandas indie e punk); vejo que nos encontramos em nossas estranhezas e referências, agora entendo a velocidade do automatismo que me levou a abraçar os dois, talvez um tanto exagerado, mas genuíno.

Durante a conversa, sentam-se à mesa conosco Clarice Lispector, Virginia Woolf, Donna Haraway, Chris Kraus, Hélio Oiticica, Lygia Clark e a cada elemento que se chega à mesa nossa conversa parece fazer mais sentido, sempre numa toada alinhavada por questões queer, não-binariedade, ceticismo sem cinismo e risadas. Um livro de capa rosa e verde me chama a atenção, não sei se me atraem mais as cores, a visualidade das esculturas que estão na imagem da capa ou o título “What do stones smell like in the forest?” (Qual o cheiro das pedras na floresta?); minha dúvida talvez possa ser explicada pelo fato de que ver aquela publicação (mesmo sem ainda tê-la folheado), ler o título e perceber as cores da imagem da capa configuram uma experiência sinestésica, performativa. Essa sensação vai se aprofundando à medida que leio fragmentos do texto e vou virando as páginas ao mesmo tempo que ouço os artistas falarem sobre seu trabalho. Todos à mesa, acredito, também ouvem: estamos na escuta de platôs e sensações, ecos e reverbes, ruídos, melodias, distorções.

Mergulhar na obra de Chloë Lum e Yannick Desranleau pode acontecer por diferentes entradas, seja pela via instalativa e objetual, pelo caminho da performance que articula dança e música contemporâneas, pela dimensão literária, conceitual, pelo non-sense, pelo humor… são múltiplos os percursos que os artistas nos possibilitam vivenciar ativamente, seja nas performances ao vivo, via objetos que compõem instalações, em vídeos, fotografias ou em textos.

Cena 2

Desta vez chove. Nossa segunda conversa chega no ponto de reconhecer o animismo das esculturas e adereços presentes nas performances desenvolvidas pela dupla – Chloë me conta que tem o projeto de realizar uma pesquisa de Doutorado neste sentido. Observando os objetos, cartas e materiais de trabalho reunidos por Chloë e Yannick durante a residência no Despina, tudo parecia realmente ressoar aquela conversa que tivemos antes, que era continuada agora. Tudo ali parecia falar algum tipo de dialeto tropical: meu inglês derretendo aos quarenta graus cariocas, o azul turquesa do anel de Chloë (que me conta este ser apenas um de uma extensa coleção de adornos variados), os óculos de grau de Yannick que me intrigam pois fico na dúvida se são os mesmos do primeiro encontro ou não (apesar do protagonismo desse objeto no rosto do artista). Chove ainda mais forte agora, e aí então vem o aroma de chuva, é dela ou do asfalto molhado exalando o vapor que tem cheiro de pedra – acho que esse é um dos cheiros de pedra numa cidade dos trópicos, ou melhor, cidade tropicalista – e assim finalmente consigo responder a mim mesma à pergunta que dá título ao livro rosa, publicação que compõe a segunda parte do trabalho que a dupla vem desenvolvendo e que está em processo de continuidade nesta residência artística na Despina.

Yannick veste para que eu veja um dos objetos que desenvolveram durante a residência – uma mistura de casaco às avessas e parangolé, feito de vinil amarelo vivo com uma borda grande meio bege, meio rosada – e imagino como seria incrível toda uma ala de escola de samba carioca usando um adereço como aquele, depois penso como será interessante a experiência dos visitantes do open studio durante o evento de finalização da residência com aquela escultura vestível.

Nossa conversa se volta novamente a trabalhos anteriores da dupla, em especial às duas primeiras partes que integram o projeto de longa duração que eles vêm desenvolvendo nos últimos anos, e que é composto por “Is it the sun or the asphalt all i see is bright black” (é o sol ou o asfalto, tudo que vejo é preto reluzente) de 2017, “What do stones smell like in the forest?” (Qual o cheiro das pedras na floresta?) de 2018 e esta terceira parte, em processo, ainda sem título, que os artistas estão dando continuidade durante a estadia no Brasil. Sempre me surpreende o quão tropical é a visualidade das obras de Chloë e Yannick: para além disso, o quão tropicalista seu trabalho pode ser considerado, o que é reforçado pelo processo que eles realizam a cada etapa da construção de suas instalações e performances; me chama a atenção especialmente a noção de “workshop the objects” ou seja, ao experimentar com os performers colaboradores como cada objeto criado para compor as performances pode atuar e dialogar com os corpos e vozes, visto que eles também definem o que será realizado fisicamente nestes trabalhos, seja por seu peso, tamanho ou ergonomia. Outra noção que reitera isso é a de que os objetos podem ser reconvocados mais de uma vez, sendo reutilizados em diferentes performances, o que dá a tais esculturas o status de colaboradores.

Interlúdio

Senado Tomado #5 – vai se aproximando o evento que abre ao público os processos desta leva de artistas residentes e ao mesmo tempo celebra a realização de suas residências. Além da escultura vestível, amarelo vivo, com uma grande borda rosada, um pouco bege, que lembra pele caucasiana, haverá também um outro vestível de vinil preto e colorido, um capuz de paetês, além de bandeiras, criadas pela dupla e confeccionadas por um artesão de carnaval, onde estão impressos textos que discorrem sobre ser assombrado, olhar para fora estando de dentro das páginas de nossos livros ou mesmo, alguns questionamentos sobre o espaço psíquico, regras sociais e a civilidade, num tom quase poético que é cético, mas não cínico. Curiosa para ver como a dupla vai orquestrar expositivamente os objetos que surgiram desta experiência nos trópicos, me lembro do cheiro de pedra (exalado na mistura da chuva fresca sobre asfalto quente) que senti durante o segundo encontro com os artistas, aquele por meio do qual eu mesma fui capaz de responder em parte a pergunta de Chloë e Yannick sobre o cheiro das pedras. No entanto, tenho também a impressão de que junto a essa memória farejo o cheiro metálico do sol escaldante sobre o asfalto e o concreto, que acredito estar misturado com o odor acre-doce do meu próprio suor, quando então percebo: eis uma das minhas portas de entrada para as experiências artisticas realizadas por “artistas tropicais além-trópicos” como Chloë Lum e Yannick Desranleau, a serem compartilhadas e vividas publicamente pelos espectadores no evento realizado pelo Despina.

A artista, curadora e professora Daniela Mattos acompanhou a residência de Chloë Lum e Yannick Desranleau na Despina no mês de novembro de 2018.

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Stephanie Black-Daniels

Stephanie Black-Daniels
01.09.2018 - 30.09.2018

Vive e trabalha em Glasgow, Escócia. Passou grande parte da sua infância e adolescência no Oriente Médio, onde iniciou seus estudos. Mais recentemente, completou seu doutorado em Artes Visuais, com especialização em Performance, na The Glasgow School of Art. Desde 2010, tem excursionado por festivais e galerias no Reino Unido, Alemanha, Lituânia, Finlândia e Estados Unidos. Em 2011, recebeu o Prêmio Athena pela New Moves International e National Review of Live Art, Glasgow. Stephanie foi orientada pela pioneira de “King Drag”, Diane Torr (1948 – 2017).

A sua minuciosa prática como moderadora de oficinas é vital para a maneira como faz, pesquisa e produz novos trabalhos. Seu mais recente workshop aconteceu no Glasgow Sculpture Studios, onde explorou a relação entre objeto e corpo através da performance. Stephanie está interessada em como um objeto pode mudar a sua interação e intimidade com os outros, criando pontuações visuais e poéticas que agem como uma chave dramatúrgica para o desenvolvimento narrativo de uma performance. Seu trabalho situa-se entre uma prática física e escultórica, cujos resultados performativos (ao vivo e documentados) combinam som, movimento, imagem, objeto, luz e vestuário. O seu comprometimento com a performance acontece a partir de um desejo de explorar a relação entre corpo e espaço, especialmente em torno do gênero e da sexualidade. Ela usa o corpo como uma ferramenta de medição e está interessada no “corpo estendido” e no “corpo como objeto” para trazer à tona questões em torno do “eu”, “o outro” e “o teatral”.

A residência de Stephanie Black-Daniels foi comissionada pelo British Council e pelo Creative Scotland dentro do programa Corpos Abertos (Open Bodies Residency), concebido em conjunto pela Despina e The Fruitmarket Gallery. Mais informações, por aqui.

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Texto crítico, por Guilherme Altmayer

A artista escocesa Stephanie Black-Daniels vem desenvolvendo sua pesquisa artística para pensar formas de expandir o corpo feminino a partir da criação de esculturas e dispositivos como vestimentas do corpo. Através destes dispositivos, a artista, em suas ações performáticas, busca explorar os limites do próprio corpo para pensar na fragilidade das relações entre corpo e espaço e suscitar questões de gênero e sexualidade a partir da fragilidade, castidade, sensualidade e selvageria, disparados através de suas práticas performativas. Sendo sua primeira visita ao Brasil, a artista se mostrou preocupada em escutar e ler o território que habitava, durante sua residência na Despina, e para tal, promoveu quatro oficinas-encontro denominados “Performando Mulheres na Cidade”, através de convocatória aberta apenas para mulheres e mulheres trans. A partir de propostas em torno de temas como rituais e selvageria, identidade e superfície, ritmos e sexualidade, os encontros, com duração de sete horas, se deram de forma individualizada com as quatro artistas participantes, garantindo intimidade para uma intensa troca de experiências, conhecimentos locais e de território e práticas performáticas. Conformaram-se aqui redes transatlânticas de alianças, de cumplicidades estético-políticas entre estranhamentos e afinidades de corpos e territórios expandidos.

* O curador e pesquisador Guilherme Altmayer acompanhou Stephanie Black-Daniels durante a sua residência na Despina.

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por Frederico Pellachin

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Vinícius Pinto Rosa

Vinícius Pinto Rosa
01.09.2018 - 30.09.2018

Vive e trabalha em Niterói (RJ). Atualmente, cursa bacharelado em Artes Visuais na Universidade Federal Fluminense e trabalha como assistente da artista mineira radicada no Rio de Janeiro Laura Lima. Sua prática incorpora questões que atravessam identidades e subjetividades na produção de objetos e instalações, tendo o próprio corpo como potência de imagem e ação, que por sua vez estabelece novas formas de relações, acessos e imagens do mundo e do outro. Realiza sua produção muito influenciado pelo universo de uma marcenaria (onde seu pai trabalha e onde acontece boa parte de sua vivência em ateliê).

Seus trabalhos atingem ao mesmo tempo campos da performance e do design, e questionam as construções, polarizações e linhas de binaridades já estabelecidas. Também revelam um hibridismo e uma multiplicidade de ativações e acessos que o corpo pode criar a partir de uma relação direta com o objeto. “Dispositivos” e “Baseline” são projetos que o artista vem desenvolvendo desde 2014 e que já foram apresentados em diversas galerias e espaços de arte brasileiros.

A residência de Vinícius Pinto Rosa foi comissionada pelo British Council e pelo Creative Scotland dentro do programa Corpos Abertos (Open Bodies Residency), concebido em conjunto pela Despina e The Fruitmarket Gallery. Mais informações, por aqui.

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Texto crítico, por Raphael Fonseca

As práticas escultóricas e suas associações com o corpo humano são alguns dos interesses centrais no percurso recente de Vinícius Pinto Rosa. Com grande habilidade artesanal e experiência com acessórios e joalheira, o artista desenvolve peças usadas tanto para a decoração, quanto para a provocação dos usos normativos do corpo humano. Para essa residência na Despina, ele desenvolveu uma série de novos trabalhos feitos em papel que, içados no teto, anteriormente foram vestidos por sua anatomia e registrados fotograficamente. Nasce com esse registro um personagem entre o humano e pós-humano, pautado na experimentação dos materiais e na fragilidade dessa matéria que é a própria vida.

* O professor e curador Raphael Fonseca acompanhou Vinícius Pinto Rosa durante a sua residência na Despina.

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por Frederico Pellachin

 

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Henry McPherson

Henry McPherson
01.09.2018 - 30.09.2018

Vive e trabalha em Glasgow, Escócia. Sua prática em composição, improvisação e performance está ancorada na produção de partituras musicais mistas, performance planejada, composição em tempo real e prática interdisciplinar e cruzada, por meio da qual ele explora identidades pessoais e coletivas, tradições musicais e performativas. Seu trabalho é intermídia e está centrado no corpo-mente, no objeto-ponto como mediador, no tema da invocação, geração impulsionada, práticas artísticas queer e sustentáveis, ​​e significados de propriedade na improvisação gerada coletivamente.

Henry é membro fundador do coletivo de artes mistas “EAST” (Experimental Artists Social Theatre), da dupla de instrumentistas (piano) “KUI” e do trio de câmara “Savage Parade”. Nos últimos anos, tem colaborado com diversos grupos e artistas, como a BBC Scottish Symphony Orchestra, a BBC Scotland, Martyn Brabbins, o RedNote Ensemble, a Glasgow New Music Expedition, Garth Knox, Zilan Liao e o Ensemble Modern, da Alemanha. É graduado em composição pelo Royal Conservatoire of Scotland e entre os prêmios que recebeu, destacam-se: Dinah Wolfe Memorial Prize for Composition (2014); Scottish Opera’s Opera Sparks Competition (2016); the Patron’s Prize for Composition (2017); the BBC Scottish Symphony Orchestra Composition Club Prize (2017); the Harriet Cohen Memorial Music Award (2018). Também foi indicado para o primeiro Scottish Awards for New Music (2017). Residências que participou como bolsista incluem: Banff Centre for the Arts and Creativiy (CA, Alberta, The Creative Gesture: Collective Composition Lab for Music and Dance) e Skammdegi Residency and Festival (IS, Olafsfjördur).

A residência de Henry McPherson foi comissionada pelo British Council e pelo Creative Scotland dentro do programa Corpos Abertos (Open Bodies Residency), concebido em conjunto pela Despina e The Fruitmarket Gallery. Mais informações, por aqui.

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Texto crítico, por Raphael Fonseca*

Musicista de formação, as experiências de Henry McPherson no campo das artes visuais costumam ter o som como ponto de partida. Práticas experimentais com instrumentos clássicos, edições de som com tempo extendido e cruzamentos entre a sala de concerta e o cubo branco tem interessado o jovem artista. Para a residência na Despina, ele realizou uma série de gravações dos sons de diferentes ambientes no Rio de Janeiro que são associados às culturas queer. Bares, pontos da prática do cruising, espaços para acolhimento e as ruas da cidade informaram o seu trabalho. Diferentes faixas foram criadas e estas podem ser escutadas individualmente dentro de um dos espaços mais íntimos da Despina – um dos três banheiros.

* O professor e curador Raphael Fonseca acompanhou Henry McPherson durante a sua residência na Despina.

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por Frederico Pellachin

 

Miro Spinelli

Miro Spinelli
01.09.2018 - 30.09.2018

Vive e trabalha no Rio de Janeiro (RJ). É mestre em Performance pelo Programa de Pós-Graduação em Artes da Cena da UFRJ e atualmente investiga a performance e sua relação com a materialidade, a escrita e a dissidência. Desde 2014 desenvolve o projeto continuado e seriado Gordura Trans, que entre ações, fotografias, textos e instalações, já foi apresentado em diversas cidades brasileiras e no exterior. O projeto já teve a colaboração de artistas como Fernanda Magalhães, Jota Mombaça e Jup Pires.

Em 2017, Miro foi contemplado como bolsista, junto à artista Luisa Marinho, para uma residência na Biblioteca Andreas Züst, na Suíça, onde desenvolveram o projeto Chupim Papers. Sua produção é atravessada por temas como precariedade, abjeção, decolonialidade, política dos afetos e transgeneridades, tendo como foco o corpo e suas possíveis poéticas e políticas. Mais recentemente, tem se interessado em pesquisar como a performance, a partir de uma conexão radical com a matéria, pode gerar forças despossessivas sobre os sujeitos, criando possíveis contra ontologias.

A residência de Miro Spinelli foi comissionada pelo British Council e pelo Creative Scotland dentro do programa Corpos Abertos (Open Bodies Residency), concebido em conjunto pela Despina e The Fruitmarket Gallery. Mais informações, por aqui.

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Texto crítico, por Guilherme Altmayer*

O artista Miro Spinelli desenvolve sua pesquisa artística a partir do próprio corpo e dos vestígios por ele deixado para pensar questões como abjeção e precariedade. Na série Gordura Trans, composta de ações performáticas (dezessete performadas até o momento), Miro promove o contato, de seu corpo nu, com diversos tipos de mídias como óleo de soja, graxa, manteiga e dendê. O material utilizado em cada ação é uma escolha política a partir do contexto social e geográfico em que está inserido. Envolto em substâncias oleosas, gordurosas, pegajosas, o artista se movimenta de forma imprevisível, com leveza e dificuldade, fundindo seu corpo ao espaço e estabelecendo uma relação com o público através da troca de olhares.

Nesta residência na Despina, o artista amplia seu campo de investigação, a partir da Gordura Trans (e para além dela), para experimentar o encontro de substâncias, em processos químicos, para a materialização de vestígios para além de seu corpo, porém dele indissociável. Utilizando como base muitos litros de óleo de cozinha de reuso, soda cáustica e água, o artista produz sabão, em grandes quantidades. Nosso senso comum nos faz pensar o sabão como símbolo de limpeza, de higienização. Porém, é com este sabão que o artista invade o espaço expositivo para manchar, sujar e se alastrar pelo cubo branco a partir de uma de suas esquinas. Uma mancha que remete à cor da pele, representativa de muitos tons. Peles que habitam corpos diversos, que provocam repensar discursos binários e higienizantes, borrando fronteiras (e esquinas) e abrindo fendas que dão a ver múltiplos outros lugares possíveis de estar no mundo.

* O curador e pesquisador Guilherme Altmayer acompanhou Miro Spinelli durante a sua residência na Despina.

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por Frederico Pellachin

 

 

 

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Sabrina Barrios

Sabrina Barrios
01.08.2018 - 31.08.2018

Nascida em Santa Maria (Rio Grande do Sul, Brasil), vive e trabalha em Nova York, EUA. Bacharel em Design Gráfico pela Universidade Federal de Santa Maria e Mestre em Artes Visuais pelo Pratt Institute de Nova York.

O trabalho de Sabrina investiga as lacunas na história humana como forma de questionar nossas idéias sobre a realidade. Misturando ciência e física quântica; mitologia e teorias da conspiração; Sabrina utiliza do simbolismo e da geometria para debater fatos ocultos ou mal-interpretados.

Suas instalações mais recentes incluem: “Plano de Fuga” (Rio de Janeiro, 2018); “Epic of Creation” (Finlândia, 2017); “Birth” (Polônia, 2017); “The Earth Experiment” (EUA, 2017); “Ley Lines” (EUA, 2017); “The Horse Rider and the Eagle” (Bruxelas, 2016) e “In Finities” (EUA, 2012). Suas pinturas já foram expostas na 4ª Bienal do Museu do Bronx (Nova York, 2017), JustMAD (Madri, 2016), Galeria Anita Schwartz (Rio de Janeiro, 2014/15), além de vídeos no MoMA (Nova York, 2013). Entre as residências que participou, destaque para: The Studios – MASS MoCA (EUA, 2017); Arteles (Finlândia, 2017); Museu do Bronx-AIM (Nova York, 2016); Bains Connective (Bruxelas, 2016) e The Wassaic Project (Nova York, 2015).

Durante a sua residência na Despina, Sabrina deu continuidade à sua pesquisa atual, que inclui transitar entre os polos contrastantes da geografia social da cidade do Rio de Janeiro, utilizando a arte como instrumento de reflexão, resistência e mudança.

Mais informações
sabrinabarrios.com

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Algumas rotas para Portais e Planos de Fuga
por Daniela Mattos

A artista Sabrina Barrios vem desenvolvendo sua pesquisa artística com muitas intensidades: algo de um feminino selvagem e alquímico (tramando o que dá corpo e materialidade às instalações, pinturas e objetos); com o rigor projetivo de seus desenhos; com suas pesquisas que imbricam teoria da conspiração, aspectos formais (mas não literais) que remetem à questões identitárias e históricas de brasilidade; com tantas outras velocidades que não caberiam aqui, talvez por sua natureza conceitual e poética quase holográfica.

Nas obras que Sabrina apresenta como parte de sua residência na Despina – talvez presente em toda sua produção em arte – há algo que nos engana, o que nosso olhar encontra ali muda a cada vez, a cada luz, a cada estado de corpo que a artista nos convoca e provoca, mas não nos obriga a ter.

Nas rotas traçadas ali, nada está dado, “você vê o que quiser, o quanto estiver disposta a captar”, ela nos diz. O que cabe a nós, portanto, é abrir nossa potência vibrátil à alquimia das formas, linhas e planos, decidindo como entraremos pelos portais que estes trabalhos engendram e escolhendo nossas próprias cartografias e planos de fuga.

A artista e curadora Daniela Mattos acompanhou Sabrina Barrios durante a sua residência na Despina.

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por Frederico Pellachin

 

Maria Marvila

Maria Marvila
12.07.2018 - 26.08.2018

Vive e trabalha em Barcelona, Espanha. ​​Atualmente é mestranda em Investigação e Produção Artística na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Barcelona, onde também é Bacharel em Artes. Durante a sua graduação, participou de um intercâmbio na Accademia di Belle Arti di Venezia. Seu trabalho já foi exposto no “Córtex Frontal”, durante residência no Arraiolos (Portugal); na galeria “lokal_30”, em Varsóvia (Polônia) e no espaço “Mecànic”, em Barcelona.

Sua pesquisa está focada no desenvolvimento da relação entre os indivíduos e os espaços por eles habitados, e suas interações subsequentes. Utilizando a ação de caminhar como forma de se aproximar e ocupar um espaço, e depois percebê-lo como um organismo vivo, Marvila observa as características de um ambiente e tenta compreendê-lo, ativando todos os sentidos, muitas vezes mudando sua própria atitude para se tornar parte dele, por meio de uma camuflagem física e mental, e também por imitação. Tendo a fotografia, escultura e instalação como principais suportes, a artista tem produzido múltiplas reflexões e representações de seus universos encontrados. Há nesse processo uma recente transição de um trabalho puramente visual para uma projeção mais tátil de ideias.

Durante a sua residência no Rio de Janeiro, Marvila procurou transitar pela cidade identificando marcas que revelam eventos e momentos passados, marcas que contribuem para a constante mutação da paisagem. Uma espécie de rastreamento das cicatrizes que estão impressas numa pele de concreto coberta por velhas e novas feridas.

Mais informações
mariamarvila.com

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Texto crítico
por Raphael Fonseca

A pesquisa desenvolvida por Maria Marvila na Despina vai de encontro às suas experiências anteriores no campo da fotografia. Interessada nas marcas que o espaço urbano trás em sua matéria – chãos, paredes, fachadas -, a artista registrava fotograficamente os desenhos e manchas gerados a partir da ação do tempo.

Durante sua temporada no Rio de Janeiro, além da fotografia, Marvila deu prosseguimento aos relevos que faz extraindo essas marcas da cidade. O que eram rachaduras e riscos se transformam em desenhos expostos para a fruição formal por parte do público. A relação com o chão – no caso de sua montagem – se perpetua devido à forma escolhida para mostrar esses objetos feitos com diferentes materiais. Um vídeo traz a artista em um de seus momentos de coleta e nos possibilita enxergar a história da cidade como um quebra-cabeça ou um mapa – muitas são as partes e, de fato, nada realmente se encaixa. O espaço público é essa sucessão de temporalidades que são amalgamadas e escapam às tentativas de sua racionalização.

O professor, curador e crítico de arte Raphael Fonseca acompanhou Maria Marvila durante a sua residência na Despina.

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por Frederico Pellachin 

Marcela Fauth

Marcela Fauth
01.07.2018 - 31.08.2018

Nascida em Porto Alegre (RS), vive e trabalha no Rio de Janeiro. É Bacharel em Artes Visuais com especialização em Figurino e Indumentária pelo SENAI-CETIQT RJ. Também é formada em Costura e Modelagem pelo SENAI RS. Participou do curso de Formação em Arte Contemporânea da Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage. É autora do livro de artista “Aquela que não estava lá”, lançado pela editora Casa 27 em 2015. Atualmente, é ativista no coletivo feminista “Vem pra luta amada”.

Sua prática artística toma forma no dia-a-dia, nas investigações das tarefas e dos processos de trabalho, nas simbologias presentes no desenvolvimento das ações e no seu próprio posicionamento perante o mundo, como mulher, trabalhadora e artista. Além de abordar questões relativas ao universo feminino e à expressão das angústias deste gênero no seu trabalho, Fauth também busca uma profunda problematização de temas como auto-imagem/auto-representação, alteridade, o corpo e seus desdobramentos no contexto sociocultural e político do mundo contemporâneo, tendo a performance como principal suporte. Fotografia, vídeo, poesia, livro de artista, serigrafia, texto, indumentária e instalação vêm sendo utilizados pela artista como formas de registro das suas experiências corpóreo-sentimentais, que lançam luz sobre alguns temas como passagem do tempo e impermanências.

Durante o período de sua residência na Despina, Fauth deu sequência à sua pesquisa sobre Performance e Feminilidades, propondo a escuta e o diálogo com diversas mulheres em um processo de criação coletiva.

Mais informações
http://cargocollective.com/mfauth

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Os Estudos da Feminilidade de Marcela Fauth
por Daniela Mattos

O projeto desenvolvido pela artista Marcela Fauth em sua residência no Despina se produziu a partir do encontros entre mulheres, de costuras (objetivas e subjetivas), aglomerados de roupas de brechó encontrados em lugares como o Rio de Janeiro e Berlim, resíduos corporais, restos da natureza coletada nas ruas em trajetos cotidianos, tecidos emprestados por outras artistas… Tudo isso compõe a materialidade desta instalação, que conta ainda com a ativação de uma performance coletiva, gerada por trocas de experiências, conversas e escritas de mulheres.

A feminilidade, isto que é performativo na mulher, algo que não é dado ou essencialista mas socialmente formado e marcado pela resistência à sociedade patriarcal e machista em que vivemos, é investigado de modos diversos por Marcela em sua pesquisa artística.

Ao mesmo tempo em que sua obra nos mostra e articula versões do feminino, Marcela Fauth nos convida a também inventar outras versões do tornar-se mulher, território sobre o qual ainda há tanto por se criar e descobrir.

A artista e curadora Daniela Mattos acompanhou Marcela Fauth durante a sua residência na Despina. Performers que participaram da ação que compõe a instalação “Às que virão depois de nós”: Ana Gabriela Costa, Ana Cândida Machado, Andrea Aguia, Karina Villafan, Marcela Fauth e Susan Soares. Também colaboraram no processo criativo durante a oficina: Isabella Lescure, Kamyla Matias, Katharina Blank, Maria Marvila e Thamires X. de Andrade.

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por Frederico Pellachin

 

Isabella Lescure

Isabella Lescure
01.07.2018 - 31.07.2018

Vive e trabalha na cidade de São Paulo, onde é graduanda em Artes Visuais na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP). A sua prática percorre situações invisíveis ou esquecidas do cotidiano, que são reconfiguradas através de recortes mnêmicos particulares. Conforme absorve e traduz as situações que a circundam, a própria experiência sensorial da artista transforma aquilo que ela escolhe reconfigurar, permitindo a emergência de novos sentidos no resultado final. Este processo pode ser materializado em pintura, colagem, bordado e objetos.

Durante a sua residência na Despina, Lescure continuou a explorar os desdobramentos de sua pintura e aproveitou para mergulhar em suas experimentações mais recentes. A sobreposição da transparência e a fragilidade do papel formando grafismos silenciosos foram pontos de partida para a sua pesquisa neste processo. Uma das características do seu trabalho artístico é não engessá-lo dentro de moldes, possibilitando que os materiais e seus objetos de estudo tenham uma função ativa no processo criativo.

Texto crítico, por Daniela Mattos*

O trabalho de Isabella Lescure é como uma membrana entre nosso olhar e sua inteligência pictórica; entre nossas impressões do que uma obra de arte pode nos proporcionar e o que reverbera da história recente da pintura contemporânea brasileira.

Impossível não mencionar a maturidade de suas composições – ainda que se trate de uma artista jovem é notório que sua trajetória vem se desenvolvendo com fluidez e é bastante promissora.

As obras apresentadas na finalização de sua residência na Despina nos mostram alguns dos caminhos poéticos desenvolvidos ao longo de suas pesquisas, que puderam ser ainda mais aprofundadas. As pinturas remetem à referências da cultura pop e à Geração 80, com cores neon, formas orgânicas e inventivas, além de um grande domínio do espaço da tela e do gesto pictórico. Seja em suas pinturas ou nos trabalhos em que a artista explora outros objetos além da tela e tinta (tais como pregos enferrujados, plástico, lã e tecido) ela nos mostra a singularidade de sua poética, desenvolvendo uma linguagem individual que não cessa de costurar este “entre” que ocupamos quando nos propomos a ver uma obra de arte.

* A artista e curadora Daniela Mattos acompanhou Isabella Lescure durante a sua residência na Despina (Julho, 2018)

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Fotos: Frederico Pellachin

Felipe Rivas San Martín

Felipe Rivas San Martín
01.05.2018 - 30.06.2018

Arte e Ativismo na América Latina – ano III

Natural do Chile, vive e trabalha em Valência, Espanha, onde atualmente é bolsista de doutorado na Comissão Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, CONICYT, da Universidade Politécnica de Valência (UPV). É mestre em Artes Visuais pela Universidade do Chile. Sua produção artística compreende pintura, desenho, performance e vídeo em confluência com a imagem tecnológica (interfaces virtuais, codecs digitais). É co-fundador do Coletivo Universitário de Dissidência Sexual, CUDS, plataforma de ativismo que participa desde 2002. Dirigiu as revistas de crítica e cultura queer “Torcida” (2005) e Disidenciasexual.cl (2009). Rivas vincula ativismo e produção artística com pesquisa, texto e curadoria relacionados à arte, política e tecnologias, teoria queer, pós-feminismo e performatividade.

Durante a sua residência no Rio de Janeiro, Felipe irá apresentar questões que transitam por sua pesquisa, como as tecnologias disciplinares e de controle às quais os corpos homossexuais são submetidos. Para tanto, pretende utilizar como foco inicial o caso dos homossexuais do Rio de Janeiro nos anos 30 do século passado, quando serviram de objeto de estudo para o livro “Homossexualismo e Endocrinologia” (Leonidio Ribeiro, 1938). Essas técnicas foram atualizadas com a nova lógica de dados e algoritmos computacionais, incluindo projetos que visam identificar a orientação sexual de pessoas com base em análises biométricas e algorítmicas. A noção de “dados” tem um duplo sentido: de um lado, refere-se aos dados, isto é, ao fenômeno da “informatização da sexualidade”. Por outro lado, “dados” refere-se ao tempo. Segundo Felipe, essas tecnologias de poder vão além do tempo e forçam o ativismo a pensar sobre a temporalidade das lutas. Daí surge a sua proposta de um “Retrofuturismo Queer “, como uma metodologia para abordar esses problemas do ativismo atual diante das tecnologias do poder. “Retrofuturismo Queer” pretende projetar o futuro do poder e das lutas maricas, através de um olhar sobre o passado de enfrentamentos e experiências de violência.

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ARTE E ATIVISMO NA AMÉRICA LATINA é um projeto da Despina, realizado em parceria com a organização holandesa Prince Claus Fund, que se estende por três anos (2016, 2017 e 2018). A cada ano, um tema norteia uma série de ações que incluem ocupações, workshops, conversas, projeções de filmes, exposições, encontros públicos com nomes importantes do pensamento artístico contemporâneo e um programa de residências artísticas. Nesta terceira edição (2018), o projeto tem como tema “DISSENSO E DESTRUIÇÃO” e acontece entre maio e junho.