Arte e Ativismo na América Latina – ano II (2017)
Tornar-se um corpo
Nas histórias feministas, a experiência não é suficiente para forjar uma voz. É necessário também um corpo, que é feito de sangue e lágrimas, fezes e babas, músculo, pele, maquiagem. Um corpo como o que possuímos. Todos os dias e em todos os lugares. Sustentamos esse corpo com palavras, o erguemos, o adornamos com acessórios e tatuagens; envolvemos esse corpo em coisas escolhidas a dedo e o levamos às ruas. Sem nunca esquecer de que há sangue correndo ali. Sim, somos feministas.
Nós dispomos esse corpo para transformá-lo em algo nosso, que goze seus próprios gozos, que inscreva o tempo ao seu ritmo, que se expanda e se contraia de acordo com seu desejo. Porque nossos corpos são escritos antes mesmo que possamos vivenciá-los. É sobre essa superfície tangível que regras são cunhadas por outros para o seu funcionamento adequado: que não tenha cheiro, que tenha apenas algumas partes destacadas, que seja limpo, que procrie, que abrigue e cuide. E se não, o quê? Se não, abjeção: prostitutas, lésbicas, feminazis, gordas, estéreis, péssimas mães.
A fala “Tornar-se um corpo” percorre desde os corpos desaparecidos pela ditadura até a criação do corpo coletivo nas manifestações feministas que permitem outras formas de ser e estar no mundo.
Marta Dillon é uma jornalista e ativista feminista lésbica que vive e trabalha em Buenos Aires, Argentina. Dirige o suplemento feminista Las12, no jornal Página12 e é participante ativa dos coletivos Ni Una Menos e Emergentes – comunicación y acción. Publicou os seguintes livros: Aparecida (2015), Vivir con virus (2004 e 2016) e Corazones Cautivos (2008). Marta também escreve roteiros para filmes de ficção e documentários. Atualmente está filmando o documentário La Línea 137.
ARTE E ATIVISMO NA AMÉRICA LATINA é um projeto da Despina, realizado em parceria com a organização holandesa Prince Claus Fund, que se estende por três anos (2016, 2017 e 2018). A cada ano, um tema norteia uma série de ações que incluem ocupações, workshops, conversas, projeções de filmes, exposições, encontros públicos com nomes importantes do pensamento artístico contemporâneo e um programa de residências artísticas. Nesta segunda edição (2017), o projeto tem como tema o CORPO e se estende de maio a outubro. Mais informações sobre o projeto, o tema e a programação completa, clique aqui.
Crédito da imagem (topo)
Foto: Sebastian Miguel